A educação sempre foi um interesse minoritário na Inglaterra. Os ingleses, em geral, preferiram manter intacta a plena beleza da ignorância e, no geral, saíram-se extraordinariamente bem, não obstante os 125 anos de educação compulsória de seus rebentos.
No passado a ignorância era puramente passiva; mera ausência de conhecimento. Recentemente, no entanto, assumiu uma qualidade mais positiva e maligna: uma profunda aversão por qualquer coisa que cheire a inteligência, educação ou cultura. Não faz muito tempo havia uma canção popular cujos primeiros versos capturavam, com sucesso, o clima generalizado de hostilidade: “Não precisamos de nenhuma educação / não precisamos de nenhum controle mental”.(1) Alguns meses atrás notei uns cartazes nas paredes anunciando uma nova canção: “Pobre, branco e estúpido”.
Gostaria de poder dizer que havia alguma ironia, mas o culto à estupidez se tornou, na Inglaterra, o que o culto à celebridade é nos Estados Unidos. Chamar alguém de inteligente nunca foi um elogio óbvio na Inglaterra, mas é necessário um tipo especial de perversidade por parte dos estudantes da escola secundária situada a uns 350 metros do hospital em que trabalho, para dizer a um dos colegas que tomou uma overdose por conta do constante assédio moral a que foi submetido: “Você é estúpido porque é inteligente”.
O que quiseram dizer com esse aparente paradoxo? Indicar que qualquer um que faça um esforço para aprender e tenha bom desempenho escolar está perdendo tempo, quando poderia estar envolvido nas verdadeiras coisas da vida, tais como cabular aulas no parque ou vagar pelo centro da cidade. Além disso, havia ameaça nas palavras deles: se você não corrigir os modos e juntar-se a nós, diziam, vamos bater em você. Isso não era uma ameaça vazia: muitas vezes encontro pessoas na minha prática hospitalar, nos seus vinte ou trinta anos, que desistem da escola sob tal constrangimento e, subsequentemente, percebem que perderam uma oportunidade que, caso tivessem aproveitado, teria mudado muito todo o curso de suas vidas para melhor. E aqueles que freqüentam as poucas escolas na cidade que mantêm padrões acadêmicos altos arriscam-se a levar uma surra, caso se atrevam a ir aonde os brancos estúpidos vivem. No ano passado, tratei de dois meninos na emergência após tal espancamento, e de dois outros que tornaram overdoses por medo, de receber uma surra pelas mãos dos vizinhos.
Assim como é impossível ir à falência subestimando o gosto do público norte-americano, da mesma maneira é impossível exagerar as abismais profundezas educacionais nas quais uma grande proporção de ingleses agora está imersa, mau sinal para o futuro do país no mercado global. Muito poucos dos jovens de dezesseis anos que atendo como pacientes conseguem ler ou escrever com facilidade, e não veem a questão de serem ou não capazes de ler como algo, no mínimo, surpreendente ou insultante. Atualmente, testo o grau de instrução básica de quase todo jovem que encontro, no caso de a falta de instrução provar ser uma das causas de seu sofrimento. (Recentemente, tive um paciente cujo irmão cometeu suicídio, em vez de enfrentar a humilhação pública de expor ao funcionário da seguridade social que era incapaz de ler os formulários que tinha de preencher.) Podemos ver só pelo modo como esses jovens seguram uma caneta ou um livro que não têm nenhuma familiaridade com tais instrumentos. Mesmo aqueles que têm a impressão de que podem ler ou escrever de maneira adequada são completamente derrotados por palavras de três silabas, e embora possam, às vezes, ler as palavras de um texto, não as compreendem melhor do que se estivessem escritas em eslavo eclesiástico.
Não lembro de ter encontrado um menina branca de dezesseis anos, procedente do conjunto habitacional próximo ao hospital, que conseguisse multiplicar 9 x 7 (não estou exagerando). Às vezes 3 x 7 os derrota. Um rapaz de dezessete anos disse-me: “Ainda não estamos tão adiantados na matéria”. Isso depois de doze anos de educação compulsória (ou, devo dizer, freqüência escolar).
Quanto aos conhecimentos em outras esferas, são quase os mesmos padrões da matemática. A maioria dos jovens brancos que encontrei não consegue, literalmente, nomear um único escritor e, por certo, não sabe recitar um verso de poesia. Nenhum de meus jovens pacientes sabia as datas da Segunda Guerra Mundial, para não mencionar as da Primeira Guerra; alguns nunca ouviram falar dessas guerras, embora um deles, que ouvira falar da Segunda Guerra; alguns nunca ouviram falar dessas guerras, embora um deles, que ouvira falar na Segunda Guerra há pouco tempo, pensasse que tivesse acontecido no século XVIII. Na circunstância da total ignorância reinante, fiquei impressionado por ele ter ouvido falar no século XVIII. O nome de Josef Stalin nada significa para esses jovens e nem mesmo soa minimamente familiar, como (às vezes) acontece com o nome de William Shakespeare. Para eles, 1066 é mais parecido com um preço do que com uma data histórica.(2)
Assim, os jovens estão condenados a viver num eterno presente, um presente que existe simplesmente, sem conexão com o passado que pode explicá-lo ou com um futuro que dele possa surgir. A vida desses jovens é, verdadeiramente, uma sucessão de maldições. Da mesma maneira, estão privados de quaisquer padrões razoáveis de comparação pelos quais julgar os próprios males. Acreditam que são carentes porque as únicas pessoas com as quais podem comparar-se são as que aparecem nos anúncios ou na televisão.
O simples semianalfabetismo e a ignorância não necessariamente impedem esses jovens de passar nos exames públicos, ao menos nas provas de nível mais baixo. Uma vez que o insucesso é visto, agora, como fatalmente prejudicial à autoestima, quem quer que se apresente para fazer as provas provavelmente sairá com um diploma. Recentemente estive com um rapaz de dezesseis anos em minha clínica que escrevia “Dear sir” [Prezado senhor] como “Deer sur” e “I’m as ime” [I’m as I am – Sou como sou] (a gramática está em plena consonância com sua ortografia), que fora aprovado nas provas públicas – em Inglês.
Claramente, algo muito estranho está acontecendo em nossas escolas. Nossas práticas educacionais atuais são tão grotescas que seria uma afronta à pena de Jonathan Swift satirizá-las. Na grande área metropolitana em que trabalho, por exemplo, os professores recebem instruções de que não devem ministrar as tradicionais disciplinas de ortografia e gramática.
Dizem que a atenção mesquinha aos detalhes da sintaxe e da ortografia inibe a criatividade da criança e a capacidade de autoexpressão, Além disso, afirmar que existe uma maneira correta de falar e de escrever é favorecer uma espécie de imperialismo cultural burguês; e dizer para a criança que ela fez algo errado é necessariamente conferir-lhe um senso de inferioridade debilitador do qual nunca se recuperará. Encontrei poucos professores que desobedeceram tais instruções numa atmosfera de clandestinidade, temendo pelos próprios empregos, o que lembra um pouco a atmosfera que cercava aqueles que secretamente tentavam propagar a verdade por trás da Cortina de Ferro.
Contaram-me de uma escola em que o diretor autorizara os professores a fazer correções, mas somente cinco por trabalho, independente do número verdadeiro de erros. Assim, é claro, preservava-se o amour-propre das crianças, mas parecia não ter ocorrido a esse pedagogo que a regra de cinco correções teria conseqüências lamentáveis. O professor poderia escolher corrigir um erro ortográfico de uma palavra, por exemplo, e desconsiderar exatamente o mesmo erro num próximo exercício. Como a criança interpretará essa correção segundo o princípio do diretor? O menos inteligente, talvez, verá como uma espécie de desastre natural, como as condições meteorológicas, e a respeito disso, pouco pode fazer; ao passo que o mais inteligente provavelmente chegará à conclusão de que o principio de correção, como tal, é inerentemente arbitrário e injusto.
O mais alarmante é que arbitrariedade reforça precisamente o tipo de disciplina que vejo, ao meu redor, ser exercida por pais cuja filosofia educacional é uma criação laissez-faire misturada com fúria insensata. Uma criança pequena corre fazendo barulho, causando estragos e destruição ao seu redor; a mãe (os pais dificilmente existem, exceto na mera acepção biológica), primeiro, ignora a criança; depois, grita para ela parar; novamente a ignora; suplica que ela pare; volta a ignorá-la; ri da criança; por fim, perde a cabeça, grita algumas ofensas e dá-lhe um safanão.
Que lição a criança tira disso? Aprende a associar a disciplina, não ao princípio e à punição, não ao próprio comportamento, mas a associá-los ao estado exasperado da mãe. Esse próprio humor dependerá de muitas variáveis, poucas sob o controle da criança. A mãe pode estar irritadiça por conta da última briga com o último namorado ou por um atraso no último pagamento do cheque da seguridade social, ou ela pode estar comparativamente tolerante porque recebeu convite para uma festa ou tenha acabado de descobrir que não está grávida. O que a criança certamente nunca aprenderá, no entanto, é que a disciplina tem um significado além da capacidade física e do desejo da mãe de impô-la.
Tudo é reduzido ao mero concurso de vontades, e assim a criança aprende que toda limitação é apenas uma imposição arbitrária de alguém ou algo maior e mais forte do que ela. Estão lançadas as bases para uma intolerância sangrenta para com qualquer autoridade, mesmo que essa autoridade esteja baseada numa patente superioridade, no conhecimento benevolente e na sabedoria. O mundo é, dessa maneira, um mundo de egos permanentemente inflamados, que tentam impor as próprias vontades uns aos outros.
Nas escolas, as crianças pequenas não são mais ensinadas em classes, mas em pequenos grupos. Esperam que aprendam por descobertas e brincadeiras. Não há quadro-negro e nada é aprendido de cor. Talvez o método de ensino que transforma tudo em brincadeira funcione quando o professor é talentoso e as crianças já estejam socializadas para aprender; todavia, quando, e normalmente é o caso, nenhuma dessas condições ocorre, os resultados são desastrosos, não só no curto prazo mas, provavelmente, para sempre.
As próprias crianças, no final, percebem que há algo errado, mesmo que não sejam capazes de articular esse conhecimento. Das gerações de crianças que cresceram com tais métodos pedagógicos, é impressionante ver quantas, das mais inteligentes do grupo, percebem, por volta dos vinte anos, que falta algo rias suas vidas. Não sabem o que é, e perguntam-me o que poderia ser. Cito-lhes Francis Bacon: “Mau centro de ações humanas é a própria pessoa”.(3) Perguntam-me o que isso quer dizer, e respondo que se não têm interesses além deles mesmos, o mundo torna-se tão pequeno quanto o era no dia em que nasceram, e que os horizontes não se expandem minimamente.
— Como vamos nos interessar por alguma coisa? — perguntam.
É aí que o efeito fatal da educação como mero entretenimento se faz notar. Para o desenvolvimento do interesse, é necessário poder de concentração e a capacidade de tolerar certo grau de tédio enquanto são aprendidos os elementos de uma determinada habilidade visando um fim meritório. Poucas pessoas são atraídas naturalmente pelos caprichos da ortografia inglesa ou pelas regras da aritmética elementar; no entanto, tais regras devem ser dominadas, caso a vida diária em um mundo cada vez mais complexo deva ser transacionada com sucesso. É um simples dever dos adultos, do ponto de vista de possuidores de maior conhecimento e experiência de mundo, transmitir às crianças o que precisam saber, de modo que, mais tarde, possam verdadeiramente escolher. A equação demagógica de toda autoridade ser um injustificado autoritarismo político, mesmo para as crianças pequenas, somente conduz ao caos pessoal e social.
Infelizmente, vinte anos não é idade para aprender a concentrar-se nem a tolerar esforços que, em si, não são prazerosos. Por nunca terem experimentado as alegrias de dominar algo pelo esforço disciplinado e com mentes profundamente influenciadas pelos movimentos rápidos e superficiais de imagens excitantes na televisão, esses jovens adultos descobrem que um interesse continuado em qualquer coisa está além do alcance. No moderno mundo urbano, qualquer um que não consiga concentrar-se é, na verdade, uma alma perdida, pois as comunidades em tal mundo são aquilo que cresce em torno de interesses que as pessoas têm em comum. Além disso, numa era de crescente mudança tecnológica, as pessoas sem habilidade ou disposição para o aprendizado ficarão cada vez mais para trás.
A patética noção pedagógica de que a educação deva ser “relevante” para as vidas das crianças ganhou terreno na Inglaterra nos anos 1960. A idéia de que isso confinaria as crianças ao mundo que já conheciam — e que também era um mundo bastante desanimador, como pode dar testemunho qualquer um com o menor contato com a classe trabalhadora inglesa — aparentemente nunca ocorreu àqueles educadores que alegavam ter excepcional comiseração pelos que estavam em relativa desvantagem. Como resultado, a estrada para o progresso social — talvez, amiúde, a mais trilhada — estava-lhes, substancialmente, fechada.
Infelizmente, é muito difícil derrubar esses incrementos pedagógicos (ou antipedagógicos) mesmo hoje, quando o governo central percebeu tardiamente as consequências desastrosas. Por quê? Primeiro, os professores e os professores dos professores nas faculdades de Pedagogia estão profundamente imbuídos dessas ideias educacionais que nos fizeram chegar a esse ponto. Segundo, uma enorme burocracia educacional cresceu na Inglaterra (um burocrata por professor, pululando como almirantes nas marinhas sul-americanas), que usa de todos os subterfúgios para evitar a mudança: da falsificação de estatísticas a interpretações errôneas intencionais da política do governo. O ministro da educação propõe, mas a burocracia dispõe. Dessa maneira, sói acontecer de a Grã-Bretanha gastar uma parcela percentualmente maior do PIB na educação que qualquer um dos concorrentes e acabar com uma população catastroficamente mal-educada, cuja falta de inteligência torna-se evidente no olhar bovino visto em cada rua do país, e que é notado por meus amigos estrangeiros.
Más como tem sido as políticas educacionais, contudo, subsiste uma dimensão cultural importante e refratária ao problema. É fácil — ao menos conceitualmente — ver o que deve ser feito no plano da política pública porém o desdém inglês pela educação não é facilmente superado, mesmo no princípio.
No bairro em que trabalho há muitos grupos de imigrantes. Os maiores são do noroeste da Índia, de Bangladesh e da Jamaica. Há também um grande número de brancos da classe trabalhadora. As crianças de todos esses grupos freqüentam as mesmas escolas ruins, com os mesmos maus professores, mas os resultados são expressivamente diferentes. As crianças dos imigrantes pobres e desempregados do noroeste da Índia nunca são analfabetos ou semianalfabetos; um número considerável prossegue nos estudos, chegando até o nível mais alto, apesar da casa superlotada e da aparente pobreza. Os outros grupos competem entre si para ver quem obtém padrão educacional mais baixo.
O fato lamentável é que uma proporção substancial da população inglesa simplesmente não percebe a necessidade da educação. Parece que estão presos na ideia vitoriana de que a Inglaterra é, por direito e pela providência divina, a oficina do inundo, que os ingleses, em virtude do local de nascimento, vêm ao mundo sabendo tudo o que é necessário que saibam e, se não houver empregos para o trabalho não qualificado (e um tanto relutante, deve-se dizer) é culpa da união do governo com os plutocratas de cartola e casaca que conspiraram para explorar a mão de obra japonesa barata. Uma coisa que um inglês jovem desempregado definitivamente não fará é concentrar esforços para adquirir qualquer habilidade para o mercado.
Tive esse tipo de conversa, em inúmeras ocasiões, com jovens em torno dos vinte anos que estão desempregados desde que deixaram a escola, cujo nível educacional geral está esboçado acima:
—Você não pensa em melhorar sua formação?
— Não.
— Por que não?
— Não tem porquê. Não tem emprego.
— Será que não teria outro motivo para buscar uma educação melhor?
— Não. (Isso após ficar perplexo com o que eu estava tentando dizer com aquilo.)
Há duas coisas que devemos notar nessa conversa. A primeira é que o jovem desempregado considera o número de empregos de uma economia como uma quantidade fixa. Assim como a renda nacional é um bolo a ser repartido em fatias iguais ou desiguais, da mesma maneira o número de empregos numa economia não guarda nenhuma relação com a conduta das pessoas que nela vivem, mas está fixado de modo imutável. Isso é um conceito de como o mundo funciona que é assiduamente vendido, não só nas escolas durante os “Estudos Sociais”, mas nos meios de comunicação de massa.
A segunda coisa que é digna de atenção é a ausência total da idéia do cultivo do intelecto como um hem em si mesmo, que possui um valor independente das perspectivas de emprego. Assim como as respostas dos pacientes às mesmas doenças e incapacidades variam de acordo com a predisposição e o temperamento, da mesma maneira a resposta de um homem ao desemprego. Alguém com interesse em buscar, ou ao menos com as ferramentas mentais para procurar, algo que lhe interesse não está em situação tão desesperadora quanto alguém que, obrigado pela tábula rasa do próprio intelecto, tem o olhar vago em quatro paredes por semanas, meses ou anos a fio. Provavelmente, terá uma idéia de um emprego autônomo ou, pelo menos, buscará trabalho em lugares e campos novos. Não está condenado à estagnação.
Existe uma grande vantagem psicológica para a subclasse branca manter desdém pela instrução: permite que mantenham a ficção de que a sociedade que os rodeia é brutal ou até grotescamente injusta e que eles são as vítimas dessa injustiça. Se, ao contrário, a educação fosse vista por eles como um meio disponível para todos ascenderem no mundo, como de fato pode acontecer em muitas sociedades, todo o ponto de vista deles terá, naturalmente, de mudar. Em vez de atribuir seus infortúnios aos outros, terão de olhar para dentro deles mesmos, o que sempre é um processo doloroso. Aqui vemos o motivo de o sucesso escolar ser extremamente desencorajado, e aqueles que não o abandonam serem perseguidos nas escolas da subclasse: é percebido, de modo incipiente, sem dúvida, como uma ameaça para todo o Weltanschauung. O sucesso de um é a exprobração de todos.
Todo um modo de vida está em jogo. Esse modo de vida é semelhante ao vício das drogas, em que o crime é a heroína e a pensão do Bem-Estar Social, a metadona. Esta última, sabemos, é o hábito mais difícil de romper, e seus prazeres, apesar de menos intensos, duram por mais tempo. A satisfação amarga de ser dependente do sistema de seguridade social é inerente à atribuição da condição de vítima, o que por si só explica, simultaneamente, o insucesso da pessoa e a absolve da obrigação de fazer algo por si mesma, ex hypothesi impossível, por causa da natureza injusta da sociedade que a tornou, primeiramente, numa vítima. O valor redentor da educação destrói todo o cenário de faz de conta: não é de admirar que tais pessoas não queiram ser educadas.
De certo modo (e somente de um modo), no entanto, a subclasse foi vitimizada ou, talvez, traída seja uma palavra melhor. Os disparates pedagógicos impingidos às classes mais baixas foram idéias, não dessas próprias classes, mas daqueles que estavam em posição de evitar seus efeitos perniciosos, ou seja, os intelectuais da classe média. Caso tivesse propensão para a paranóia (o que, felizmente, não tenho), diria que os esforços dos pedagogos foram parte de um imenso complô das classes médias para conservar o poder para si mesmas e restringir a competição, no processo de criar sinecuras para alguns de seus membros menos capazes e dinâmicos — a saber, os pedagogos. Caso essas classes médias tenham conservado o poder, foi em um país enfraquecido e empobrecido.
1995
(1) No original: “We don’t need no education / We don’t need no thought control”. Trecho de “Another Brick in the Wall (Part 2)”, faixa do álbum The Wall (1979) da banda inglesa Pink Floyd. (N. T.).
(2) Ano da conquista da Inglaterra pelos normandos. (N. T.).
(3) Francis Bacon, Ensaios. Trad. e pref. Álvaro Ribeiro. Lisboa, Guimarães Editores, 1992, XIII, p. 98. (N. T.)
Transcrito do livro: A Vida Na Sarjeta (Capítulo 7). Theodore Dalrymple (Anthony Daniels). São Paulo, É Realizações, 2014.
Sobre o livro:
A pior pobreza é a da alma:
http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/a-pior-pobreza-e-a-da-alma
Livro:
http://www.erealizacoes.com.br/produto/a-vida-na-sarjeta---o-circulo-vicioso-da-miseria-moral